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PORTUGAL 2014: AS CONSEQUÊNCIAS DE UM RESGATE

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Entre o segundo trimestre de 2011 e o ter-

ceiro trimestre de 2014 ocorreu uma acentuada

quebra do rendimento dos salários (de 5,8 mil

milhões de euros, ou seja, uma redução de

6,9 %) acompanhada de um significativo au-

mento da remuneração do capital (3,5 mil mi-

lhões de euros a mais nos rendimentos de pro-

priedade, um acréscimo de 36 %, e 860 milhões

de euros a mais, 2,8 %, no excedente bruto de

exploração das empresas).

Apesar do aumento do desemprego e da

queda de valor dos salários, o resgate acentuou

as restrições no acesso e no valor das prestações

sociais. A partir de 2010, antes mesmo da en-

trada em vigor do programa de ajustamento,

generalizaram-se mecanismos de avaliação das

condições de recursos dos beneficiários, estabe-

lecendo-se limites a partir dos quais não seriam

concedidos apoios. Esse crivo foi mais apertado

em 2012, já sob a orientação da

troika

.

Em 2011, os beneficiários de apoio ao de-

semprego correspondiam a 53,6 % do total dos

desempregados registados. Passados 3 anos,

essa percentagem desceu para 52,7 %.

Paralelamente a duração do subsídio de desem-

prego e o seu valor foram reduzidos. O resulta-

do foi uma diminuição na despesa com o de-

semprego ao longo do período, precisamente

quando o desemprego mais subia.

As restantes prestações sociais (à exceção

das pensões que aumentaram em valor global

não obstante os cortes no seu valor), sofreram,

entre 2011 e 2014, um corte de 6,3 %.

5

Paralelamente, as políticas sociais foram sujeitas

a uma reconfiguração profunda, traduzida no

incentivo e financiamento da atividade de insti-

tuições que prestam apoio social de pendor as-

sistencialista.

5

 Instituto de Segurança Social, Estatísticas.

Ao desemprego, à desvalorização do trabalho

e à regressão dos apoios sociais, o resgate acres-

centou ainda um acentuado aumento da carga

fiscal que incide sobre os rendimentos do traba-

lho, acompanhado de um alívio das taxas que

incidem sobre os rendimentos das empresas.

O corolário deste processo, como não podia

deixar de ser foi o aprofundamento das desi-

gualdades sociais em Portugal. As estatísticas

divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística

(INE) dão uma pálida imagem deste agravamen-

to ao revelarem que o Índice de Gini, respeitan-

te à distribuição do rendimento, passou de

34,2 %, em 2010, para 34,5 %, em 2013. Na

realidade, o agravamento das desigualdades

tem expressão em factos que a distribuição do

rendimento direto caracteriza mal: crianças e

adolescentes que passam a abandonar mais

precocemente ainda o sistema de ensino, pes-

soas que deixam de aceder aos cuidados de saú-

de pelos seus custos ou passam a estar sujeitos

a mais longas filas de espera, ou famílias que

deixam de poder suportar despesas de arrenda-

mento ou juros de crédito hipotecário e vêm

comprometido o direito à habitação.

Nada disto foi medido, ou sequer tido em

conta, pela troika nas suas avaliações do progra-

ma. Muito menos foi considerada a pior conse-

quência do resgate: a destruição da esperança de

toda uma jovem geração. Se for possível medir a

desesperança, os números da emigração são os

mais eloquentes: mais de cemmil emigrantes por

ano de 2011 a 2013 – números só comparáveis

em Portugal com os da década de 1960.

Conclusão

O resgate português foi muito mais do que um

“programa de ajustamento”, imposto a uma

economia endividada em troca de financiamento.